Esconderijo
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As palavras iam saindo da boca e recheando a mesa
com histórias engraçadas e contos mirabolantes. Todas eram saboreadas
rapidamente pelos sorrisos fáceis das minhas companhias.
Num movimento quase imperceptível, um vendedor de
redes chega ao lado disposto a nos fazer descansar. Recusei o produto que
parecia mais tentador depois da refeição.
Aquele senhor tinha a pele calejada pelo árduo
trabalho. As cicatrizes naturais do tempo não lhe deixavam aparentar menos de
60 anos. Não tinha o ressentimento de fim de vida que a muitos acompanha. Pelo
contrário, o contentamento era singular e sem motivo aparente.
Antes mesmo
do sorriso daquele velho homem esmorecer com a resposta negativa, apontou para
minha mão. Absorto, demorei para entender, e então mostrei-lhe a palma.
Num golpe seco como aquela tarde, recebo as
palavras ditas pelo velho homem: – ‘Você tem um amor secreto’. Disse ele, como
se estivesse a vender um emaranhado de tecidos.
Intrigado, retribui uma face surpresa e recebi o
mesmo sorriso indecifrável. Perscrutei a neblina mórbida da minha densa
imaginação. Poderia esconder algo de mim mesmo?
Num instante clarividente e antes de embalar os pensamentos,
as redes já estavam sendo vendidas na próxima mesa. Eu sabia que era tarde
demais.
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